Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles “A Ditadura Encurralada”.
Bolsonarismo não existe, é antipetismo essencialmente conservador
Eleitor brasileiro só seguiu maciçamente um líder, Getúlio, e depois Lula
Está ocorrendo uma certa confusão entre as preferências eleitorais conservadoras e aquilo que seria um fenômeno chamado de bolsonarismo. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Um conservador não é necessariamente um bolsonarista.
Se o bolsonarismo fosse o que parece ser, Alexandre Ramagem, candidato a prefeito do Rio de Janeiro, estaria disputando competitivamente com Eduardo Paes. Pelo Datafolha, Paes tem 56% das preferências, e Alexandre Ramagem, fiel escudeiro de Bolsonaro, tem 9%.
Em 2018, quando uma onda antipetista e conservadora varreu o país, Bolsonaro levou a Presidência, elegeu seu filho para o Senado e o “poste” Wilson Witzel levou o Governo do Rio.
Já em São Paulo, dois candidatos com atitudes diferentes (Pablo Marçal e Ricardo Nunes) unidos contra um candidato de esquerda (Guilherme Boulos) têm 40% das preferências. Esse é o tamanho do bloco conservador. O bolsonarista oficial seria Nunes que, estando na prefeitura, tem 19% e foi ultrapassado por Marçal, o dissidente.
A onda de 2016 perdeu vigor em São Paulo na eleição municipal de 2020, e Lula ganhou na capital em 2022.
O eleitor brasileiro só seguiu maciçamente um líder político que, a partir do governo, deu-lhe resultados sociais e políticos. Foi Getúlio Vargas. Depois dele, veio Lula, em ponto menor, até porque mais de meio século separa os dois.
O suposto bolsonarismo é uma tendência conservadora e antipetista, apenas isso. Esse bolsonarismo não tem nem sequer o tamanho do velho lacerdismo. Carlos Lacerda, como Bolsonaro, foi um feroz oposicionista de Getúlio Vargas e de seus herdeiros.
À diferença do ex-capitão, Lacerda governou a cidade do Rio por quatro anos e teve um desempenho exemplar, coisa que não aconteceu com a Presidência de Bolsonaro. (O candidato de Lacerda perdeu a eleição em 1965 porque era pesado e ambos estavam associados à ditadura. Se tudo isso fosse pouco, Negrão de Lima, o vencedor, era a bonomia em pessoa.)
Não existe bolsonarismo, o que há na cena é um antipetismo, essencialmente conservador. O ex-capitão ajudou a tirá-lo do armário. Antes de Bolsonaro, o Brasil teve uma ditadura de 21 anos com quatro generais num grande armário. Nenhum deles se dizia conservador, muito menos direitista.
O conservadorismo segue caminhos próprios. Esse é o caso de Ronaldo Caiado em Goiás, que começou a liderar o agronegócio quando Bolsonaro ainda era um capitão indisciplinado. Em São Paulo, Tarcísio de Freitas é uma criação de Bolsonaro, mas, governando o estado, segue-o de forma tímida.
De certa maneira, a ideia de que exista um bolsonarismo afaga o ego de Jair Messias e convém ao PT, pois associa alguns adversários conservadores à gestão do ex-presidente.
Esse suposto bolsonarismo tornou-se uma película que embaça a vista da janela. Um conservador não precisa de Messias.